domingo, 24 de maio de 2009

A loucura dos reis – Ivan e Pedro


No século XVI, a Rússia apenas começava a assumir seu lugar como grande potência na história europeia. Para os ocidentais, os russos continuavam sendo um povo misterioso e semibárbaro. A Rússia estava à margem da civilização ocidental. O temperamento eslavo parecia particularmente propenso a emoções extremas de amor e ódio, piedade e terror, temas que atravessaram a música dos grandes compositores eslavos e despertaram o gênio dos romancistas russos. Pródigas e excêntricas qualidades pessoais são exibidas por dois dos maiores soberanos russos, os czares:
  • Ivan IV – o terrível
  • Pedro – o grande
Houve traços que beiravam a genialidade em suas políticas, em sua determinação e no controle férreo que exerceram sobre seu povo. Sua genialidade, contudo foi prejudicada, se não por verdadeira loucura, ao menos por uma falta de equilíbrio mental. Ivan e Pedro foram separados por um século, mas o governo de ambos fundou-se num apelo semelhante ao terror e à tortura.

Ivan, o Terrível – tinha 3 anos quando sucedeu ao pai como grão-duque de Moscóvia, em 1533. Sua mãe, a grã duquesa viúva Elena, foi uma regente arbitrária e impopular até morrer em 1538, provavelmente envenenada. Seguiu-se uma luta pelo poder no Estado entre duas famílias principescas rivais: os Belskis e os Shuiskis, estes últimos venceram. Os poderosos baiardos* russos trataram o jovem príncipe como um brinquedo. Carente de comida e de roupas, tratado com desonra, Ivan sofreu humilhações que criaram em sua mente uma cicatriz profunda que o tempo nunca obliterou por completo. Sentia evidente prazer em provocar dor. Mas era um menino inteligente, lia muito e era fascinado pelas crônicas da história da Rússia.

Foi coroado em janeiro de 1547, numa esplendorosa cerimônia na catedral de Uspenski, em Moscou. A medida que amadureceu, adquiriu forte consciência de seu destino semidivino, estimulado pelos ensinamentos da Igreja. Quis conquistar a boa vontade de seus súditos num sentido mais amplo, então:
  • iniciou reformas muito necessárias
  • fez contatos com o Ocidente
  • estimulou contatos com a Inglaterra
  • fez ganhos territoriais – anexou Kazan e Astracã
  • empurrou as fronteiras do grão ducado para o sul e o leste
Ivan teve forte afeição por sua primeira mulher, Anastácia Romanova Zakarin, filha de uma antiga família boiarda.

Ivan exibia todos os sinais de estar se tornando um soberano não apenas capaz, mas bem atento aos interesses de seu povo. Em 1553, ele caiu gravemente doente e passou algum tempo desenganado, pode ter sido um ataque de encefalite ou mesmo um mal de natureza sifilítica. Ivan começou a se preocupar com a segurança da sucessão de seu filho bebê. Depois da doença, o caráter do czar parece ter sofrido uma constante deteriorização e as vezes chegava às raias da loucura, mais especialmente, após a morte de sua primeira esposa Anastácia, em 1560.

Um avanço no seu desequilíbrio mental ocorreu em 1564-65, por causa da crescente desconfiança que sentia de seus próprios cortesãos, Ivan deixou Moscou e refugiou-se no Mosteiro de Alexandrovskaia Slobeda, nas profundezas de uma floresta escura, 179 km a nordeste da cidade. Tinha 35 anos, mas parecia um velho:
  • face enrugada, quase calvo e exibia uma barba rala e fina, em seus ataques de fúria, tendia a arrancar o próprio cabelo

Casamentos – a vida conjugal havia se tornado instável e tempestuosa, revelando seu egocentrismo e seu temperamento maníaco. Depois de Anastácia, casou-se com:
  1. Maria – uma beldade circassiana, filha do príncipe Temric, que morreu em 1º de setembro de 1569
  2. Marta Sobakin – casamento em 28 out 1571, filha de um negociante de Novgorod, mas morreu duas semanas mais tarde, antes mesmo que o casamento se consumasse
  3. Ana Alexeevna – cansou-se dela e a despachou para um mosteiro
  4. Ana Vassilchikura – logo desapereceu
  5. Vasilissa Melentievna – tomou um amante e este foi empalado por ordem do czar sob a janela de sua mulher, que depois foi enviada a força para um convento
  6. Maria Dolgurikaia – quando Ivan descobriu que ela não era mais virgem, em seu horror e ira mandou que a afogassem no dia seguinte
  7. Maria Feodrovna – última mulher
Ivan ficou viciado em mercúrio depois de sua doença, que era mantido burbulhando num caldeirão em seu quarto para seu consumo. Na exumação de seu corpo, tempos depois, mostrou que foi vítima de envenenamento por mercúrio. Em 1581, deu bengaladas na esposa do filho que estava grávida, que sofreu um aborto, quando o filho protestou, Ivan investiu contra ele desferindo-lhe um golpe fatal. Ficou abalado com a morte de seu filho e herdeiro, pela qual ele próprio fora responsável e começou a vagar pelos corredores do palácio, procurando em vão pelo herdeiro.

Em 1584, adoeceu gravemente. Em 19 de março de 1584 morreu, o filho que o sucedeu, czar Fiodor I, foi um príncipe piedoso, apelidado de "o Sineiro" por causa de seu amor aos serviços religiosos, mas parece que tinha um intelecto fraco e era mentalmente retardado.


Pedro, o Grande – alguns dos excessos de sua personalidade são explicáveis até certo ponto à luz de suas experiências infantis. Foi 14º filho do czar Alexis, filho único de sua 2ª esposa, Natália. Nasceu no Kremlin dia 30 maio 1672. Tinha 4 anos quando o pai morreu. Imediatamente a Rússia mergulhou em 12 anos de desgoverno e numa luta de poder entre os boiardos* que apoiavam uma outra das esposas do falecido czar. Pedro e sua mãe várias vezes tiveram que se esconder, para preservar sua vida. As humilhações que passou na infância ficaram para sempre gravadas em sua mente. Finalmente houve uma revolução palaciana que lhe permitiu relegar a meia irmã aos duvidosos confortos de um convento, enquanto seu meio irmão Ivan V, que nunca passara de uma nulidade, morreu em 1696. Pedro assume o governo:
  • restaura a nação
  • transforma a Rússia em potência
  • cria uma nova capital em São Petersburgo
  • constrói uma frota
  • treina um exército
  • remodela a burocracia
  • torna a Igreja subserviente à sua vontade

Tinha cerca de 2.10m de altura e era um homem assombrosamente forte. Gostava de se fazer dentista amador, grande apreciador de trabalhos braçais, um artesão e um sapateiro habilidoso. Andava tão depressa que seus companheiros tinham dificuldade de acompanhá-lo. Aprendeu alemão e holandês sozinho.

Pedro foi inegavelmente uma figura heróica, foi o homem que rompeu os grilhões do passado, com ele a Rússia pertenceu à Europa e ao Ocidente. Desafiou os baiardos*, ainda feudais e introduziu idéias e costumes ocidentais modernos na ainda tradicional Moscóvia. Reestruturou o Estado. Homem de enorme gênio criativo, porém traços extravagantes, sintomáticos, se não de loucura, pelo menos de profundo distúrbio psicológico. Religiosidade convencional, atribuía seu sucesso na guerra, à benevolência de Deus. As sombras escuras da mente de Pedro talvez se refletissem sobretudo na violência e na crueldade com que tratava seus adversários. O modo como tratou seu filho e herdeiro Alexis, sob alguns aspectos compreensível, revelou seu caráter psicopático. Alexis filho de seu casamento com Eudóxia, era uma decepção para Pedro, não tinha talento, nem gosto por atividades militares. Com medo do pai Alexis fugiu, mas foi convencido de retornar. Foi preso e levado a julgamento, morto por consequência de 40 golpes de cnute que recebeu.

Pedro tinha medo de dormir sozinho e se não tivesse uma mulher, punha um ordenança ao seu lado. Acabou tomando como companheira permanente uma criada alemã, Catarina que acabaria sendo coroada czarina. Catarina conseguia acalmá-lo, deitando sua cabeça em seu colo até que ele adormecesse. Houve muitas sugestões de sua doença:
  1. convulsões epiléticas
  2. encefalite causando disfunção cerebral
  3. desequilíbrio mental por causa do avanço da sífilis
  4. experiências traumáticas da infância
  5. prolongado abuso de álcool, também afeta a saúde e a conduta
A saúde geral de Pedro estava debilitando. Bem cedo na manhã de 28 janeiro de 1725, morreu de uma dolorosa enfermidade da bexiga e de cirrose hepática. Depois de Pedro os soberanos da Rússia seriam em sua maioria, homens e mulheres de caráter e de alguma habilidade.


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* Boiardo era o título atribuído aos membros da aristocracia russa do século X ao século XVII. Na Rússia feudal, eles constituíam a classe mais alta e detinham poder político através da Duma boiarda. Para além de extensas propriedades que detinham, eram os legisladores principais do Principado de Kiev. Mesmo depois de Moscovo passar a ser o centro de decisão, com a centralização de poder para o papel do Grande Duque de Moscóvia, a sua influência ainda perdurou. A Duma boiarda que inicialmente contava com cerca de 30 membros, foi-se progressivamente expandindo, tendo mesmo chegado a contar com cerca de 100 membros já no século XVII. Foi contudo abolida por Pedro, o Grande, em 1711.
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Origem: 'A Loucura dos Reis' de Vivian Green

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Benção


"Que o caminho seja brando a teus pés, O vento sopre leve em teus ombros.Que o sol brilhe cálido sobre tua face, As chuvas caiam serenas em teus campos. E até que eu de novo te veja.... Que Deus te guarde na palma de Sua mão."
(Uma antiga bênção Irlandesa)
 
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